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segunda-feira, 5 de abril de 2021

CAP. 02/08 - fichamento - livro - O FIO DAS MISSANGAS - autor: mocambicano MIA COUTO (escritor, poeta, médico, biólogo)

 continuação do capítulo 01/08

Se escrevesse por carta...  “Você, marido, enquanto vivo me impediu de viver”.

         Diante do espelho:   “Só peço um oxalá: que eu fique viúva o quanto antes!”       ... tempo, o dono do corpo.

         “Como a pedra, que não tem espera nem é esperada, fiquei sem idade”

         “No funeral, o choro será assim, queixo erguido para demorar a lágrima, nariz empinado para não fungar.   A sua vida me apagou.  A sua morte me fará nascer”.        (quando ele de fato morreu, ela sentiu)

         “E me esgueirei pelo quintal”. 

         Conto:   A saia almarrotada

         “Na minha vila, a única vila do mundo, as mulheres sonhavam com vestidos novos para saírem.  Para serem abraçadas pela felicidade.   Nasci para a cozinha, pano e pranto”.    Ensinaram-me tanta vergonha em sentir prazer, que acabei sentindo prazer em ter vergonha.

         Eu tinha joelhos era para descansar as mãos.   As outras se divertiam e ela, não.     “E nem inveja sentiria.  Mais do que o dia seguinte, eu esperava pela vida seguinte.

         Ela foi criada pelo pai e o tio.   Perdeu a mãe cedo.    “Eles que quiseram casta e guardada”.    ...”desde nascença, o pudor adiou o amor”.

         Casa de pobre e pouca comida.   “Em casa de pobre ser o último é ser nenhum”.    – “Deixem um pouco para a miúda”.   Nem meu nome falavam.   Não tendo nome, faltava só não ter corpo.

         “Na minha vila as mulheres cantavam.  Eu pranteava”.

         Magra e sem gingado.   “O meu rabo nunca foi louvado por olhar de macho”.

 

         Conto:    O adiado avô

         O pai não foi ao hospital ver o novo netinho que chegou.   A filha Gloria ficou indignada.   Só em casa, deu uma olhada.   “Mas foi como um olhar para nada”.    Pediram interferência da mãe para o pai mudar de atitude.

         “Falasse era fraqueza de expressão:  a mãe era muda, a sua voz esquecera de nascer”.    ... nós, pobres, devíamos alargar a garganta não para falar, mas para engolir sapos.

         - É o que repito:  falar é fácil.   Custa é aprender a calar.

         Voltou pra casa o avô depois de ter abandonado o lar.  Voltou e ficou especado.    Ele chorou.   Aí ele se interessou em ver o neto.   Como se os dois tivessem nascido recente.   O avô e o adiado neto.  O avô adiou o tempo de aceita-lo.

         Meu pai nunca antes fora filho de ninguém.  Por isso não sabia ser avô.    “E vai ver que esse nosso neto nos vai fazer sermos nós, menos sós, mais avós”.

         Quando a irmã, mãe do miúdo retornar, terá surpresa do avô aceitando o neto.    A irmã não vai contar.   “Minha mãe que é muda que conte”.

                   ..... continua no capítulo 03/08 (um por dia)

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