continuação do capítulo 01/08
Se escrevesse por carta... “Você, marido, enquanto vivo me impediu de
viver”.
Diante
do espelho: “Só peço um oxalá: que eu
fique viúva o quanto antes!” ...
tempo, o dono do corpo.
“Como a
pedra, que não tem espera nem é esperada, fiquei sem idade”
“No
funeral, o choro será assim, queixo erguido para demorar a lágrima, nariz
empinado para não fungar. A sua vida me
apagou. A sua morte me fará
nascer”. (quando ele de fato
morreu, ela sentiu)
“E me
esgueirei pelo quintal”.
Conto: A saia almarrotada
“Na
minha vila, a única vila do mundo, as mulheres sonhavam com vestidos novos para
saírem. Para serem abraçadas pela
felicidade. Nasci para a cozinha, pano
e pranto”. Ensinaram-me tanta vergonha
em sentir prazer, que acabei sentindo prazer em ter vergonha.
Eu tinha
joelhos era para descansar as mãos. As
outras se divertiam e ela, não. “E
nem inveja sentiria. Mais do que o dia
seguinte, eu esperava pela vida seguinte.
Ela foi
criada pelo pai e o tio. Perdeu a mãe
cedo. “Eles que quiseram casta e
guardada”. ...”desde nascença, o pudor
adiou o amor”.
Casa de
pobre e pouca comida. “Em casa de pobre
ser o último é ser nenhum”. – “Deixem
um pouco para a miúda”. Nem meu nome
falavam. Não tendo nome, faltava só não
ter corpo.
“Na
minha vila as mulheres cantavam. Eu
pranteava”.
Magra e
sem gingado. “O meu rabo nunca foi
louvado por olhar de macho”.
Conto: O adiado avô
O pai
não foi ao hospital ver o novo netinho que chegou. A filha Gloria ficou indignada. Só em casa, deu uma olhada. “Mas foi como um olhar para nada”. Pediram interferência da mãe para o pai
mudar de atitude.
“Falasse
era fraqueza de expressão: a mãe era
muda, a sua voz esquecera de nascer”.
... nós, pobres, devíamos alargar a garganta não para falar, mas para
engolir sapos.
- É o
que repito: falar é fácil. Custa é aprender a calar.
Voltou
pra casa o avô depois de ter abandonado o lar.
Voltou e ficou especado. Ele
chorou. Aí ele se interessou em ver o
neto. Como se os dois tivessem nascido
recente. O avô e o adiado neto. O avô adiou o tempo de aceita-lo.
Meu pai
nunca antes fora filho de ninguém. Por
isso não sabia ser avô. “E vai ver que
esse nosso neto nos vai fazer sermos nós, menos sós, mais avós”.
Quando a
irmã, mãe do miúdo retornar, terá surpresa do avô aceitando o neto. A irmã não vai contar. “Minha mãe que é muda que conte”.
.....
continua no capítulo 03/08 (um por dia)
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